quarta-feira, 7 de junho de 2023

O Livro Negro do Cristianismo

 


O Livro Negro do Cristianismo

Dois mil anos de crimes em nome de Deus

Jacopo Fo. Sergio Tomat. Laura Malucelli

Introdução

Na Introdução os autores fazem uma evolução das atrocidades cometidas pela Igreja Católica do século IV, quando se tornou a Igreja oficial do Estado Romano, até o século XVIII. Mas distingue estas ações dos trabalhos humanísticos dos cristãos distanciados das lideranças do clero corrupto existente ao longo da História. Mostra que o mundo é mais humano hoje por essas ações. Um nome importante nestas ações humanas foi São Francisco de Assis. Fala resumidamente sobre as violências praticadas na Europa pela Inquisição, que atingiu outras regiões como a América Colonial e a África, e a omissão e apoio dado ao genocídio judeu, ao nazismo e fascismo, e às ditaduras sanguinárias da Europa e da América Latina.

Desenvolvimento

Muitos podem pensar que o autor já vai falando das violências praticadas pela Igreja Católica em sua história, mas este não é o plano da obra. Começa narrando, e fazendo leves considerações sobre o surgimento de Jesus e Paulo no cenário dos primeiros cristãos. Realça a diferença entre as pregações de Jesus diante dos discursos de outros "profetas" de seu tempo e das ideias e práticas dos fariseus. Mostra também, mais longamente a ação de Paulo, antigo perseguidor dos cristãos, e depois o principal divulgador do cristianismo pelo mundo conhecido da época. Sobre Paulo destaca sua discriminação com as mulheres, coisa diferente da prática de Jesus, e suas diferenças com os discípulos, mostrando um lado pouco cooperativo nas relações com seus companheiros, inclusive com Pedro, considerado o Pai da Igreja. 

O autor trabalha bem a questão histórica da origem do Cristianismo, principalmente explicando como teve início a relação do Império Romano com os primeiros cristãos. Faz uma biografia de Constantino que deu início ao domínio do Império Romano sobre os primeiros cristãos. Mostra a política adotada por Constantino quando percebeu o crescimento dos cristãos na sociedade da época, diante dessa nova realidade, dá liberdade de culto a uma seita, antes subversiva que passa a fazer parte do governo imperial. Mostra o lado cruel de Constantino, um Imperador assassino, que passa a dominar toda a sociedade, agora com o apoio dos cristãos, que recebem cargos públicos, coisa não aceita pelo cristianismo primitivo. Começa então o poder político e econômico da Igreja Católica na Idade Média. De perseguidos passam a ser perseguidores de hereges. Constantino convoca o Concílio de Niceia que determina a Trindade e a unidade do Catolicismo. 

Sobre os hereges e as heresias mostra, o autor, que eram questões mais de unidade da Igreja e ajustes políticos. Os Concílios tinham como objetivo desfazer quaisquer divergências com o pensamento majoritário sobre as questões doutrinárias, que muitas vezes eram revistas em Concílios futuros. Revela também que até hoje as heresias da Idade Média continuam vivas em Igrejas de países, principalmente na África e Oriente. Mas as questões das heresias foram acompanhadas de punições e assassinatos. E os privilegiados tinham direitos políticos como a isenção de impostos e transmissão de cargos por hereditariedade. Enfim, era um bom negócio estar com a maioria. Mas muitos tiveram a coragem de combater esta situação e defender suas ideias. 

As lutas religiosas e pelo poder continuam sem parar, e os Papas fazem parte desses conflitos para garantir um patrimônio maior para a Igreja. Os Concílios se sucedem para combater as heresias e confirmar ideias dos governantes em matéria de doutrina católica. O Ocidente e o Oriente lutam em busca de uma unidade política e religiosa... e as milhares de mortes se sucedem. No tempo de Carlos Magno, rei francês, a Igreja novamente se alia ao Estado acumulando poder que se estenderá por toda a Idade Média. Carlos Magno conquistou quase toda a Europa impondo com violência seu poder político e da Igreja. Foi venerado e coroado pelo Papa como Imperador do Sacro Império Romano, consolidando a separação da Igreja Ocidental da Igreja de Bizâncio, ou Império Romano do Oriente. O autor faz um relato sobre os Papas mais licenciosos do período; que de religiosidade não tinham nada.

Sobre as Cruzadas o livro possui um capítulo mais amplo, pois a ação do Movimento foram extremamente importantes para mostrar como a Igreja Católica apoiou e usou a boa vontade e religiosidade das pessoas na Idade Média para alcançar os objetivos papais, utilizando métodos condenáveis como o grande número de assassinatos em nome de Deus. A narrativa é de deixar espanto em leitores menos acostumados com esse tipo de informação. Até as crianças participaram das Cruzadas, e a Igreja viu tudo sem se manifestar, pois faziam parte de seu projeto de poder a todo custo. No capítulo sobre as heresias faz uma relação da ação dos hereges com o poder instituído da Igreja e da nobreza. Mostra como os hereges foram reprimidos de forma violenta e assassina para garantir o domínio da classe dominante eclesiástica e nobre sobre a sociedade medieval. Faz um relato breve sobre algumas heresias e suas características na prática religiosa de seu tempo. Interessante notar como a Igreja perseguia as próprias Ordens Religiosas utilizando o recurso das Cruzadas.

O autor faz um bom estudo sobre a formação do texto da Bíblia, inclusive mostrando que os cristãos, os judeus e os muçulmanos são os religiosos do livro, pois seguem os ensinamentos escritos de suas respectivas religiões. A Bíblia católica surgiu depois de uma união dos vários textos esparsos selecionados por São Jerônimo, no século IV, formando a edição chamada de Vulgata, escrita em latim. Depois foram publicações em línguas nacionais, principalmente depois do surgimento da prensa de Gutenberg. Este fato aumentou o número de edições, logo a Igreja passou a proibir sua leitura pelo povo, pois assim veriam as contradições dos escritos bíblicos com a prática do clero católico. A Bíblia foi o primeiro livro impresso pelos tipos móveis de Gutenberg. A Inquisição ganha um capítulo inteiro no livro, e revela fatos interessantes e pouco conhecidos sobre a instituição, como a divisão dentro da Igreja Católica sobre sua prática. Não foram todos os religiosos que apoiaram a perseguição sistemática dos hereges dentro da prática religiosa, principalmente na Idade Média.

A famosa caça às bruxas na Idade Média ocupa lugar de destaque no livro. Interessante notar que este fato não se limita ao período medieval, mas se estende pela Idade Moderna, e sendo praticada tanto por católicos como protestantes depois da Reforma de Lutero. O autor mostra alguns métodos de tortura, os motivos e o principal alvo que eram as mulheres. Certamente um combate da sociedade patriarcal ao poder da mulher, principalmente nas curas de doenças com ervas medicinais e, na função primordial de parteiras. É um capítulo recheado de atos violentos contra o ser humano praticado em nome de Deus. Dá uma certa revolta ver retratada e registrada tanta violência, inclusive contra crianças. E surpreende a ação das Ordens Religiosas, principalmente dos Dominicanos no processo, pois os escritores do Martelo das Feiticeiras eram monges dominicanos.

A Reforma Protestante, principalmente a partir das ações de Lutero e Calvino não desfaz a prática violenta da religião na Idade Média. Lutero foi corajoso ao enfrentar o poder do Papa e contestar a aberração das Indulgências, que parece ser o ápice da corrupção do Vaticano. Mas os protestantes também praticam seus atos de violência contra os católicos. De qualquer forma, o Protestantismo marca uma nova fase na História religiosa, principalmente da Europa. O autor é bem didático na produção do texto sobre a Reforma Protestante. Um texto com subtítulos que esclarecem bem os fatos históricos ocorridos no período, principalmente no século XV, mas sem muita análise, mais uma História Factual, que não deixa de ser útil e informativa. A Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), marca o ápice da violência em nome de Deus, pois católicos quanto protestantes vivem momentos de extrema desumanidade, tanto é que o número de mortos durante o conflito se equipara ao ocorrido nas duas Guerras Mundiais do século XX.

Na Idade Moderna, ou seja, a época do Colonialismo e da Escravidão indígena e africana, a Igreja Católica, assim como as Protestantes, tiveram papel preponderante com a violência praticada contra as civilizações nativas da América e da África. Mesmo que alguns padres e Bispos tenham defendido e denunciado as atrocidades, sua ação teve efeito  mínimo no quadro geral da colonização/exploração das áreas fora do continente europeu. O Bispo Bartolomeu De Las Casas foi o principal nome nas denúncias dessas atrocidades, tendo publicado livros sobre o assunto e levado a situação até os reis da Espanha. Interessante notar como as Ordens Religiosas participaram ativamente da violência contra os indígenas da América, principalmente a Companhia de Jesus, ou Jesuítas, que torturam e tinham exércitos que impressionaram até os "soldados" portugueses. O Papa sempre foi cúmplice de tal barbaridade em "Nome de Deus". O continente africano sofreu essa violência de forma sistemática até o século XX.

A História da Igreja Católica no século XX e suas relações políticas, sociais e econômicas é de dar indignação a qualquer cristão. É uma mistura de corrupção, violência, falcatruas, pedofilia, mentiras, omissão e nada de cristianismo. O autor faz um relato de arrepiar, mesmo com textos curtos e objetivos. É até difícil de acreditar que uma instituição histórica e tão respeitada foi capaz de fazer tanta coisa degradante ao longo de seu período de poder. E continua a fazê-lo até hoje. Verdadeiras aberrações! Nos Apêndices, o autor fala mais sobre as heresias, e seus principais líderes, sobre a Reforma Protestante e suas lideranças, a Contra-Reforma, e até sobre os métodos de tortura utilizados pela Inquisição. Digno de nota a discriminação feita aos judeus pela Igreja Católica, ainda na Idade Média, quando os mesmos, entre outras restrições, tinham de usar uma identificação para sua crença, como no Nazismo alemão. Talvez daí o apoio do Vaticano aos regimes totalitários no século XX. É um livro pra quem tem nervos fortes!

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